Minha primeira banda de rock foi meu bilhete só de ida pra um universo sobre duas rodas, intenso e apaixonante. Foi à bordo de uma Kombi branca que cheguei, aos 16 anos, no meu primeiro encontro motociclista, junto com cinco meninos magrelos de longos cabelos, guitarras nas costas e Creedence no repertório.
As motos reluziam sob um sol que nos aquecia; era em um dia lindo, de céu azul muito aberto. Um típico dia de inverno gaúcho. Eu, do palco, cantava alguma conhecida canção composta lá por 1969, e os garotos bonitos, as moças e os tiozões de colete jeans ou couro bebiam e cantavam de volta pra mim. Foram dois anos incríveis fazendo shows frequentes nos palcos dos eventos, conhecendo pessoas e admirando as motos customizadas.
Apesar das memórias que me fazem suspirar, de lá pra cá a vida deu voltas dignas de uma montanha-russa. Após uma profunda frustração amorosa na época, entrei numa espiral existencial e neguei a música e o rock na minha vida, enquanto tentava também me desvencilhar da paixão pelas motos e de tudo que me remetia ao ex, que pertencia ao mesmo universo. Passei anos evitando e duvidando das coisas que mais me emocionavam. Era como se eu estivesse negando quem eu de fato era, quem de fato sou.
Sempre que eu trazia à tona o desejo ou a dúvida de ter moto e me envolver novamente com a cena, um bom amigo motociclista, que me acompanha desde os tempos da Kombi branca, me dizia:
“Tudo tem seu tempo. E eu tenho certeza que a tua moto vai chegar”.
Foram anos lambendo as feridas. Mudei de país, voltei ao Brasil, mudei de estado, mudei, mudei, mudei… Sem saber, dei o tal do “tempo ao tempo” para cada coisa voltar ao seu lugar de origem. Ao todo, somei 12 anos como motociclista-sem-moto e rockeira-sem-rock. Busquei dentro de mim (e em alguns velhos discos de vinil) as respostas capazes de preencher as lacunas emocionais que iriam me reconectar com as coisas que eu mais gostava, e então uma velha chama reacendeu muito, muito mais forte.
Me senti recomposta, revigorada e grata pelo tempo que havia passado e, com ele, a maturidade que chegara.
Com 28 anos finalmente decidi tirar minha carta e passei na prova na primeira tentativa; debaixo de uma chuva gelada e fina, desci da moto tremendo de alegria e de frio. Levei mais dois anos até comprar minha moto, uma Chopper Road 150 CC, zeradinha, que chegou na minha casa reluzindo como as motos que eu havia admirado no meu primeiro evento motociclista. Que êxtase! O sonho e o desejo de sentir o vento na cara se tornando realidade, onde até mesmo a primeira multa foi motivo de festa!
Neste mês, maio de 2020, completo meu primeiro ano como motociclista-com-moto e os desafios e novos objetivos não param! Depois de dar a partida, é preciso acelerar, não é?!
Decidi me matricular num curso de mecânica de motos, estou planejando a customização da minha moto e me preparando para a primeira viagem longa, de São Paulo ao Rio Grande do Sul.
Mas… mesmo com tantos planos e entusiasmo com o futuro, toda vez que cruzo com uma Kombi branca me transporto para aquela primeiríssima tarde ensolarada de rock’n roll e motocicletas, e me lembro que preciso ser paciente para que as coisas cheguem no tempo certo, agora sabendo que, com certeza, tudo tem seu tempo.
Eu sou a Dride! Rebelde com muitas causas, designer-musicista e, em essência, um pássaro.
No instagram: @drrride
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